Como um conto de fadas, no Dia das Mães, todos os anos os carinhos de mães e filhas caminham pela cidade nas manhãs do segundo domingo do mês de maio.
Nas avenidas das selvas de pedras, por alguns momentos, sob os horizontes, o dia amanhece levando a serenidade, o amor e os afetos, unidos as belas rosas e flores que se encontram nos cruzamentos movidos pelos sons das buzinas dos carros e das motos, que correm insanos, pelas vias e curvas do tempo para chegar com a cesta da felicidade da mamãe. Ao som das palmas ou das cigarras, chegou o dia: Feliz Dia das Mães!
No mesmo instante, do outro lado da cidade, outros sons ecoam dissipando os céus, rompendo o Dia das Mães…, se misturando aos murmúrios, ao som da cirene, aos gritos e choros de mãe, filhas e filhos. A cena se tornou comum, uma mãe que perdeu sua filha, e a filha ou os filhos que perderam sua mãe para o feminicidio!
Uma cena trágica, dentro de várias realidades, que se cruzam pela normalidade e naturalidade, que os crimes de feminicídios assolam cotidianamente a vida das mulheres na sociedade.
De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, entre 2015 e 2023 cerca de 37.420 vidas de mulheres foram assassinadas, dessas, 10.655 tiveram suas vidas ceifadas pelo feminicídio. Somente no ano de 2023, ocorreram 1.467 mortes femininas por razão de gênero no Brasil, o equivalente a mais de 122 assassinatos por mês ou a mais de 4 mulheres ou pessoas trans que são vítimas do feminicídio por dia, por conta do machismo estrutural e da misoginia que a sociedade patriarcal insiste em manter vivo em detrimento da vida de mulheres e meninas .
As estatísticas se aprofundam cada vez mais, a edição de 2024 do Atlas da Violência (IPEA/FBSP) , apresenta dados de violência contra mulheres e meninas, a partir dos atendimentos no sistema de saúde em 2022, onde revela que foram mais de 140 mil casos de violência doméstica contra mulheres e meninas de todas as faixas etárias. Este cenário de violência, torna-se ainda mais sinistro, quando os dados revelam que a violência se inicia ainda na primeira infância e continua até a idade dos 70 e 80 anos.
O Monitor de Feminicídio no Brasil, realizado pela Universidade Estadual de Londrina (julho/2024) e o LESFEM, apresenta os números de Feminicídios consumados no Brasil, no primeiro semestre de 2024. Nesse contexto, 11 estados estão acima da média nacional que é de 1.3 por cada 100 mil habitantes. Nessa estatística, alguns estados da região norte, na Amazônia legal, aparecem com uma taxa superior à média nacional.
Na base de dados do Monitor do Feminicídio, o estado do Mato Grosso aparece em primeiro com 1.65, o Amazonas 1.52, Acre 1.45, Rondônia 1.39, Tocantins 1,33, Roraima 1.26 e o Pará com a menor taxa de 0.74. Tal cenário indica que alguns estados da Amazônia, os crimes de feminicídio, são recorrentes e crescem, na medida que as mulheres se encontram em regiões periféricas, longe das políticas de proteção social e segurança, tornando-as mais vulneráveis, comparadas a outras regiões do País.
Rondônia em 2022, aparece como um dos estados que mais mata mulheres, com uma taxa de 3,1 casos para cada 100 mil mulheres, sendo o estado com a maior taxa de feminicídio (FBSP/2022), com total de 24 feminicídios. Em 2023, Rondônia assume o 2º lugar no ranking, com uma das maiores taxas de feminicídio, junto com outros estados da região norte, com 2,4 mortes por cada 100 mil mulheres, totalizando 21 feminicídios . No ano de 2024, conforme o Observatório Estadual de Segurança Pública, ocorreram 10 feminicídios, somente no primeiro trimestre, totalizando 13 casos. Em 2025, os dados indicam no primeiro trimestre, os mesmos números de mulheres assassinadas, com 10 crimes de feminicídio em Rondônia de janeiro a abril. Numa escala de 5 anos, 98 vidas de mulheres foram ceifadas pelo feminicídio em Rondônia.
A morte, o assassinato de mulheres nos jornais, espalhadas pelos quatro cantos das cidades brasileiras, tem sido a realidade que a sociedade tem convivido rotineiramente. Cabe tanto aos órgãos de governo, como também a sociedade, permanecer vigilantes e desconstruir esse comportamento de estado patriarcal, machista, que coloca mulheres e meninas em situação de extrema vulnerabilidades. Importa agora, nesta jornada, romper tanto com o estado de violências baseada em gênero sobre os corpos femininos, como ainda, promover várias cestas de direitos e proteção social para proteger, não só a vida das mulheres, mas sobretudo, promover a sua desnaturalização na sociedade.
Desse modo, as mulheres se levantam afirmam: Não queremos mais flores, essas, muitas vezes, colocam espinhos que perfuram nossas almas e tiram nossas vidas! A cesta de café, as cestas de flores, as cestas, todas elas, poderiam vir cheias de direitos…, Direitos humanos, direitos à proteção, Direito à segurança, saúde, educação…, do direito à vida.
As mulheres querem de presente, no Dia das Mães…, as suas vidas!
Por Benedita Nascimento
Fórum popular de Mulheres/Porto Velho
Movimento Articulado de Mulheres da Amazônia (MAMA)
Levante Feminista contra o Feminicídio, Transfeminicídio e Lesbocídio em Rondônia.
Imagem: Freepik
